Fumaça e espelhos

Fumaça e espelhos
27/08/2024 por Editorial

Incêndios no Brasil: campanha de ódio tenta proteger governo e culpar os agricultores

Quando o sol escaldante seca a terra, o fogo se espalha como uma reação natural, transformando o que antes era vegetação em cinzas e fumaça que sobem aos céus. É um ciclo conhecido por nós brasileiros, intensificado pelo clima seco, especialmente em tempos de El Niño. Contudo, o que deveria ser uma discussão sobre gestão e prevenção de desastres naturais está se transformando, mais uma vez, em um campo de batalha político.

O fenômeno ocorreu em várias partes da América do Sul, mas no Brasil houve um foco especial nos biomas da Amazônia e do Pantanal, bem como no estado de São Paulo. Nos últimos dias, os incêndios que tomaram conta do interior de São Paulo ganharam destaque na mídia, com imagens alarmantes de chamas e fumaça dominando as manchetes. Não é surpresa que o interesse dos brasileiros tenha seguido o mesmo rumo: segundo o Google Trends, houve um pico nas buscas relacionadas a queimadas, especialmente na Amazônia, entre 18 e 24 de agosto.

A verdade é que o Brasil enfrenta uma das piores ondas de incêndios em anos, com 48 cidades do interior paulista em alerta máximo. O próprio mês de agosto foi o pior da história do estado paulista em termos de focos de incêndio, desde que os registros começaram em 1998.

A Amazônia experimenta recorde de queimadas desde 2014. A região não só sofre com a estiagem de 2024, com ainda sofre consequências da estiagem de 2023, e o próprio governo fala da seca mais severa nos últimos 20 anos.

Ainda assim, a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, optou por sugerir que os incêndios são fruto de ações criminosas, abrindo caminho para uma narrativa que não contribui para a solução do problema, mas sim para acirrar divisões no nosso país.

Isso ativou uma campanha coordenada nas redes sociais, onde forças governistas transformam as queimadas em uma grande conspiração contra o governo. Em especial na plataforma “X” (antigo Twitter), termos como “Agro” ganharam espaço nas tendências. Isso se deve a tal campanha que tenta vincular o agronegócio aos incêndios, com slogans como “Agro é fogo” e “Agro é criminoso”. Essa narrativa, promovida por certos setores, visa claramente transferir a culpa das queimadas para o setor agrícola representado como um bloco político monolítico. 

Essa tentativa de politizar os incêndios é preocupante. Já estava previsto que as queimadas seriam um desafio neste ano, devido a fatores climáticos como o tempo seco e o El Niño. O próprio governo, junto ao IBAMA, já havia tomado medidas antecipadas, e o presidente Lula editou uma Medida Provisória para liberar recursos voltados ao combate das queimadas. Então, por que a necessidade de criar vilões e alimentar campanhas de ódio?

Perfis dedicados usam imagens de outros contextos, outros anos, inclusive de atos regulares, onde é visível a presença de aceiros e da atuação de profissionais. Caso existam agricultores ou trabalhadores realizando queimadas no período crítico, de forma irregular, devemos pensar antes em eventuais dificuldades econômicas ou limitações educacionais, a ausência de infraestrutura, não em uma conspiração política de ruralistas para "pressionar o governo Lula".

É preciso separar os fatos das narrativas políticas para que possamos lidar com os desafios reais que nosso país enfrenta, sem cair em discursos belicosos que apenas dividem os brasileiros. Em São Paulo, três pessoas foram presas e uma delas estava incendiando lixo. É possível que esses incêndios surjam de causas humanas: queimadas de terreno que se descontrolam, ou destruição de resíduos. Nada disso, porém, justifica o conspiracionismo das forças governistas.

Neste momento crítico, é fundamental que o debate se concentre na gestão adequada e eficiente dos recursos para combater os incêndios, sem cair na armadilha de transformar desastres naturais em armas da política suja e divisionista. Infelizmente, muitos poderosos usam essas situações como convém: hoje o culpado é o agro, amanhã voltarão a falar da “emergência climática permanente” (um oxímoro) e usar esses acontecimentos como pretexto para fortalecer os setores que já aparelharam o Estado brasileiro, bem como para assinar tratados internacionais que amarram nossa soberania em nome da causa verde.

Os magos do governo não manipulam o fogo, mas sabem incendiar a comunicação, encantando o público com um jogo de fumaça e espelhos. Quando vamos olhar para o lado certo?

Editorial

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