De origem alemã, nascido nos Estados Unidos e naturalizado colombiano, Martin von Hildebrand é conhecido como etnólogo. De uma família de intelectuais, é neto do filósofo católico Dietrich von Hildebrand. Formado na França, von Hildebrand passou a trabalhar com a questão indígena no Estado colombiano através do Ministério da Educação. Depois, no governo do liberal Virgilio Barco Vargas, foi nomeado chefe de Assuntos Indígenas do Ministério do Interior e conselheiro do presidente. Nessa posição, foi pioneiro no estabelecimento de zonas de conservação onde a atividade humana é em grande parte restrita em terras indígenas em nome da preservação ambiental. Sua gestão caracterizou-se pela renúncia a projetos de reforma agrária e colonização em prol de restrições indigenistas e ambientalistas.
Ao sair do governo, von Hildebrand também foi um dos pioneiros no sistema de articulação de ONGs ambientalistas financiadas por grandes fundações do Primeiro Mundo, ao criar sua ONG Gaia Amazonas em 1991. Com nome sugestivo e reminiscente de temas do ambientalismo radical, a Gaia Amazonas diz buscar "proteção integral" da floresta amazônica e é financiada pela Agência Francesa para a Cooperação, pela NORAD (Agência Norueguesa para o Desenvolvimento e Cooperação), pelo Ministério de Relações Exteriores da Grã-Bretanha, pelo Ministério das Relações Exteriores dos Países Baixos, além de organizações como a Rainforest Foundation da Noruega, a Mulago, a Moore Foundation, a Swift Foundation, a Climate and Land Use Alliance, dentre outras. Indo além, Hildebrand criou o Programa COAMA como um sistema de coordenação entre ONGs amazônicas, tendo como um dos objetivos a promoção de "autonomias indígenas". Dentro do seu projeto que conjuga "autonomia indígena" com "preservação ambiental", o antropólogo militante ganhou infâmia por propor a ideia da "Triple A", um corredor transnacional de zonas de preservação e terras indígenas que vai dos Andes, passa pela Amazônia e termina no Atlântico. Abraçada pelo ex-presidente Juan Manuel Santos como uma proposta para agradar os ambientalistas do Primeiro Mundo na COP de 2019, a proposta foi criticada por Jair Bolsonaro quando este era presidente do Brasil.
No seu livro autobiográfico — conforme citado pelo El País — vemos uma colocação que é repetida muitas vezes por muitos outros ambientalistas, como aqueles que ocupam as páginas de Sumaúma, de que os indígenas são a referência mundial da conservação ambiental, "fator fundamental na resposta planetária ante a emergência climática que vivemos". A argumentação cultural e os motivos espirituais são usados para justificar a restrição das atividades humanas nessas terras convertidas em autonomias indígenas.
A escolha dessa figura pelo governo colombiano, no momento liderado por Gustavo Petro, para a secretaria-geral da Organização do Tratado de Cooperação Amazônica, deveria ser encarada pelos brasileiros e por todos os Estados-membros como uma provocação contrária ao espírito do tratado, que vai pautar a próxima reunião em função das ideias ambientalistas radicais que Hildebrand sempre defendeu e representou, além de escancarar as portas de uma organização multilateral formada por Estados para ONGs que querem diminuir o poder e a soberania desses Estados.
O Tratado de Cooperação Amazônica é um pacto livre entre Estados soberanos buscando o desenvolvimento das suas respectivas regiões amazônicas. O texto pactuado fala primeiro de compartilhar experiências nacionais em matéria de desenvolvimento regional, depois de equilibrar desenvolvimento econômico com a preservação do meio ambiente. O Artigo XI é muito claro:
“Com o propósito de incrementar o emprego racional dos recurso humanos e naturais de seus respectivos territórios amazônicos, as Partes Contratantes concordam em estimular a realização de estudos e a adoção de medidas conjuntas tendentes a promover o desenvolvimento econômico e social desses territórios e a gerar formas de complementação que reforcem as ações previstas nos planos nacionais para referidos territórios.“
Em seu discurso de posse, Martin von Hildebrand declarou que não basta a cooperação entre governos, mas é preciso abrir as portas para a “sociedade civil” e os “povos indígenas”, flertando com a ideia de uma jurisdição que se projete acima das soberanias nacionais.
A sua posse indica que a próxima reunião do Tratado será voltada inteiramente para a preservação e “restauração” ambiental, mas não para o desenvolvimento, não para a cura dos desastres sociais que afligem as populações amazônicas. Mais do que isso, é certo que tal acontecimento implode a OTCA como fórum de reivindicações desenvolvimentistas que poderiam ser impulsionadas na COP30 contra o tom acusatório e exigente que imperará a partir dos países desenvolvidos, sobretudo da Europa.
Editorial
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